A estrutura paralela montada na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Bolsonaro sob o guarda-chuva do então diretor-geral do órgão, o atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), monitorou ao menos três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e até uma promotora de Justiça que investigava o assassinato da vereadora Marielle Franco, apontou despacho do ministro do STF Alexandre de Moraes vista pela Reuters. Moraes autorizou nesta quinta-feira uma operação da Polícia Federal que teve Ramagem como principal alvo das buscas e apreensões. A PF chegou a pedir a suspensão de Ramagem — que é delegado de carreira da corporação — do cargo de deputado federal, mas o ministro do STF rejeitou o pedido. Ramagem por ora não se manifestou publicamente sobre a operação. Procurada, a assessoria de imprensa dele disse que o deputado está “se inteirando da operação ainda” e irá se posicionar posteriormente. “A Polícia Federal aponta que Alexandre Ramagem utilizou de sua posição de diretor-geral da Abin para incentivar e encobrir a utilização indevida da ferramenta First Mile, bem como — aponta a natureza gravíssima — da sua posição de parlamentar para requisitar informações sobre as investigações subsequentes”, afirmou o magistrado. “Em que pese a gravidade das condutas do investigado, Alexandre Ramagem, bem analisada pela Polícia Federal, nesse momento da investigação não se vislumbra a atual necessidade e adequação de afastamento de suas funções. Essa hipótese poderá ser reanalisada se o investigado voltar a utilizar suas funções para interferir na produção probatória ou no curso das investigações”, decidiu. As investigações apontaram que a Abin foi instrumentalizada para se tentar fazer uma indevida associação de deputados federais e dos ministros do STF Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Gilmar Mendes com a organização criminosa Primeiro Comando da Capital, o PCC, de acordo cm o despacho. “O arquivo ‘Prévia Nini.docx’ mostra a distorção, para fins políticos, da providência, indicando a pretensão última de relacionar… os ministros do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes com a organização criminosa Primeiro Comando da Capital – PCC, alimentando a difusão de fake news contra os magistrados da Suprema Corte”, disse Moraes, citando trecho de representação da Procuradoria-Geral da República. O ex-deputado Rodrigo Maia, que presidiu a Câmara nos dois primeiros anos do mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro e com que o então presidente teve grandes embates, também foi alvo da estrutura paralela montada na Abin, segundo as investigações mencionadas no despacho de Moraes. Essa estrutura chegou a monitorar o dono de um carro que participou de um jantar onde estava Maia. No caso do assassinato da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco, que foi morta a tiros em uma emboscada em março de 2018, as investigações identificaram um resumo do currículo da promotora de Justiça do Rio de Janeiro que coordenava a força-tarefa sobre o homicídio, de acordo com a decisão do ministro do Supremo. “O documento tem a mesma ausência de identidade visual nos moldes dos relatórios apócrifos da estrutura paralela”, destacou a decisão de Moraes. Filhos de Bolsonaro Na decisão, Moraes destacou que a Abin também foi utilizada para “fins ilícitos” para a preparação de relatórios para a defesa do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente que foi alvo de investigações da PF. Também foram usados os serviços da agência para interferir em investigações e fazer prova a favor de Jair Renan Bolsonaro, outro filho do presidente. “A utilização da Abin para fins ilícitos é, novamente, apontada pela Polícia Federal e confirmada na investigação quando demonstra a preparação de relatórios para defesa do senador Flávio Bolsonaro, sob responsabilidade de Marcelo Bormevet, que ocupava o posto de chefe do Centro de Inteligência Nacional – CIN, como bem destacado pela Procuradoria-Geral da República”, citou Moraes, em um dos trechos. Em nota, Flávio Bolsonaro disse ser mentira que a Abin tenha atuado para favorecê-lo. “Isso é um completo absurdo e mais uma tentativa de criar falsas narrativas para atacar o sobrenome Bolsonaro”, disse. Jair Renan não se manifestou num primeiro momento. Um representante de Bolsonaro não respondeu de imediato a um pedido de comentário sobre a operação.
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