 “Também temos soluções táticas mais fortes. Nossa operação ‘Teia de Aranha’ provou isso ontem. A Rússia precisa sentir o que suas perdas significam”, afirmou o líder ucraniano Volodymyr Zelensky, um dia depois de um dos mais ousados — se não os mais — ataques em solo russo desde o início da guerra, em fevereiro de 2022. Seus drones atingiram bases militares nos arredores de Moscou, no Ártico e na Sibéria, a mais de 4,5 mil km de distância da Ucrânia, destruindo, segundo informações de Kiev, dezenas de aeronaves, incluindo algumas capazes de realizar ataques nucleares. Uma ação que foi apelidada de “Pearl Harbor russo” por blogueiros militares pró-Kremlin, referência ao ataque japonês contra a base no estado do Havaí, em 1941, que marcou a entrada dos EUA na Segunda Guerra Mundial. A comparação pode ser exagerada — 2,3 mil militares dos EUA morreram em Pearl Harbor, e centenas de aviões e navios foram destruídos — mas a “Teia de Aranha” ucraniana causou um impacto sensível à máquina militar russa, que vai além da guerra de Putin na Ucrânia. A começar pelos danos materiais. Segundo a inteligência militar ucraniana, as aeronaves danificadas ou destruídas incluem o Beriev A-50, cujo papel é coordenar a ação de caças de combate e identificar sistemas de defesa, como os usados por Kiev. Estima-se que apenas 10 estejam em operação hoje, e ao menos três foram destruídos desde o início da invasão — eles pararam de ser produzidos em 1992. Outros dois modelos citados são os Tupolev Tu-95 e Tu-22M3, que têm capacidade para realizar ataques convencionais e também com armas nucleares. O Tu-95 integra, ao lado do Tu-160, um dos pilares da tríade nuclear russa. Tal como o A-50, os Tu-95 os Tu-22M3 não são mais produzidos desde o fim da União Soviética. Apesar do escopo da ação, ninguém acredita que os drones farão Vladimir Putin alterar seus planos de curto prazo. A Rússia tem intensificado seus bombardeios nas últimas semanas, e posicionou 50 mil militares na fronteira nordeste da Ucrânia. Alguns de seus apoiadores mais ferrenhos já defendem uma resposta em grande escala, incluindo com armas nucleares, mas o governo dificilmente os atenderá. Mas há outro tipo de dano difícil de amenizar: o psicológico. Ver drones de US$ 600 destruindo aeronaves de US$ 100 milhões na Sibéria mostrou, mais uma vez, as vulnerabilidades dos sistemas de defesa locais diante de uma estratégia militar baseada em novas tecnologias. Com as aeronaves, Kiev mandou a mensagem de que nenhum lugar é seguro na Federação Russa, e que o Estado russo não será capaz de garantir a integridade de seus cidadãos enquanto continuar atacando o território ucraniano. Internamente, a sensação de fracasso dos serviços de segurança pode minar a confiança no regime, ao lado de fatores como a instabilidade econômica. “O audacioso ataque de drones da Ucrânia mina o próprio sistema de segurança russo, tanto quanto representa uma ameaça militar”, escreveu no jornal The Moscow Times Kevin Riehle, professor da Universidade Brunel, de Londres. “A realidade da ameaça corre o risco de expor o sistema de segurança como incompetente.” Também há uma mensagem a Donald Trump. Em fevereiro, durante altercação com Zelensky na Casa Branca, o líder americano disse que Kiev “não tinha cartas” para usar na guerra contra Putin. Com o ataque, o ucraniano mostra que conseguiu se adaptar às circunstâncias e que não está derrotado. Resta saber se será suficiente para que os EUA retomem a postura mais crítica a Moscou.
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