O cabo de guerra entre o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), e a Câmara dos Deputados continua movimentando os dias normalmente tranquilos do recesso parlamentar e judiciário, no fim deste ano. O magistrado respondeu a um pedido apresentado pela Casa legislativa para que ele revisse a decisão de suspender o pagamento de R$ 4,2 bilhões das chamadas emendas de comissão e estipulou um prazo até as 20 horas desta sexta-feira (27) para que a Câmara responda “objetivamente” a quatro perguntas sobre o tema. De forma geral, o ministro quer saber quando essas emendas foram aprovadas pelas comissões da Câmara, se houve indicações adicionais incluídas na lista após as reuniões das comissões temáticas e quem fez e aprovou essas indicações. Dino também pergunta aos deputados de que forma a resolução de 2006 do Congresso Nacional que disciplina a Comissão Mista de Orçamento (CMO) prevê a tramitação das emendas. O ministro do Supremo também questiona onde estão determinadas as regras usadas pelo Congresso para a aprovação dessas emendas – se não estiverem na resolução de 2006. Veja a íntegra das perguntas de Flávio Dino à Câmara dos Deputados:
O imbróglio das emendasNa última terça-feira (24), a Polícia Federal (PF) instaurou um inquérito que deve apurar a liberação de R$ 4,2 bilhões das chamadas emendas parlamentares de comissão cujos autores não foram devidamente identificados. A corporação atende a uma determinação de Flávio Dino, no âmbito da decisão da última segunda-feira (23) que suspendeu o pagamento das emendas, em uma nova escalada da tensão entre os Poderes Judiciário e Legislativo que marcou este ano. Do montante, cerca de R$ 180 milhões se referem a “novas indicações” e R$ 73 milhões são destinados ao estado de Alagoas, berço político-eleitoral do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) – que está se despedindo do comando da Casa, cargo que ocupará somente até o fim de janeiro de 2025. As emendas parlamentares, que estão previstas dentro do Orçamento, são utilizadas de acordo com indicação de deputados e senadores – o dinheiro, em geral, é encaminhado pelos parlamentares para atender suas bases eleitorais. A execução dessas verbas é prerrogativa do governo federal. A decisão do ministro do STF atendeu a um pedido apresentado pelo PSOL, que alegou irregularidades na destinação de R$ 4,2 bilhões nas chamadas emendas de comissão. Essa categoria de emendas parlamentares é indicada por comissões temáticas da Câmara dos Deputados e do Senado – e não tem pagamento obrigatório. Após a derrubada das emendas de relator pelo Supremo, as emendas de comissão foram ampliadas. Na petição apresentada ao STF, o PSOL questionou o ofício que autorizou o repasse das verbas. O documento foi encaminhado por Arthur Lira, no último dia 12, com a assinatura de 17 líderes partidários na Casa. Na ação ao Supremo, o PSOL afirma que parte das emendas foi destinada para o estado de Lira, Alagoas, o que seria ilegal. Por meio do Ministério da Casa Civil, o governo federal não viu qualquer irregularidade e autorizou o repasse. Em sua decisão, Flávio Dino exigiu que a Câmara divulgasse, em um prazo de até cinco dias, as atas das reuniões de comissões nas quais as emendas foram aprovadas. Essas atas deveriam ser encaminhadas à Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, comandada pelo ministro Alexandre Padilha (PT). Ainda de acordo com o despacho de Dino, o pagamento das emendas só será liberado depois de as atas chegarem ao Palácio do Planalto – e desde que atendam aos critérios de transparência e rastreabilidade definidos anteriormente pela Corte. “Tamanha degradação institucional constitui um inaceitável quadro de inconstitucionalidades em série, demandando a perseverante atuação do Supremo Tribunal Federal”, anotou Flávio Dino em sua decisão. Câmara pede liberação do pagamentoEm recurso encaminhado a Dino na manhã desta sexta-feira (27), a Câmara pediu a revisão da decisão que mandou suspender o pagamento das emendas. A petição, de 22 páginas, é assinada pelo advogado Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva. No documento, o defensor rebate a ação proposta pelo PSOL, pelo Partido Novo e pelas entidades Associação Contas Abertas, Transparência Brasil e Transparência Internacional, que alegaram que a indicação de mais de 5,4 mil emendas teria ocorrido sem a aprovação das comissões e no período em que as reuniões dos colegiados haviam sido suspensas por Arthur Lira, entre os dias 12 e 20 de dezembro. “Com a devida vênia, a argumentação dos peticionantes não corresponde à verdade e revela profundo desconhecimento do processo legislativo orçamentário. Essas informações imprecisas e descontextualizadas impedem a correta apreciação e valoração dos fatos”, diz o advogado da Câmara. A defesa da Câmara afirma que as emendas foram aprovadas pelas comissões ao longo do ciclo legislativo. “A aprovação das emendas pelas comissões se dá a partir de sugestões feitas por parlamentares e aprovadas formalmente pelos colegiados. Após a aprovação e sanção, ocorrem as indicações ao Poder Executivo que, de acordo com a LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias] para o exercício de 2024, não têm caráter vinculante”, diz a defesa da Casa legislativa. Executivo perdeu poder sobre orçamentoNos últimos, os sucessivos governos foram perdendo poder, gradativamente, sobre a execução do orçamento federal. Em 2015, ainda durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), o Congresso Nacional aprovou o orçamento impositivo, por meio do qual as emendas destinadas a deputados e senadores devem ser pagas, obrigatoriamente, pelo governo federal. No governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), foram instituídas as chamadas “emendas Pix”, ampliando a fatia de recursos sob o guarda-chuva do Legislativo. Hoje, o Congresso detém cerca de R$ 60 bilhões do orçamento, o que representa quase o mesmo volume comandado pelo Executivo federal. |
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