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Judiciário

Lei Magnitsky: Moraes pode seguir caminho de oligarcas russos e líderes autoritários

- 19/08/2025 6 Visualizações 6 Pessoas viram 0 Comentários
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A sanção do governo de Donald Trump contra o ministro Alexandre de Moraes, com base na Lei Magnitsky, aproxima o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) de uma lista restrita e simbólica: a de indivíduos acusados pelos Estados Unidos de violações graves de direitos humanos ou corrupção sistêmica.

Mais do que o gesto diplomático inédito, que nunca um brasileiro havia sido incluído, a designação impõe riscos práticos ao magistrado, com potencial de exclusão financeira, digital e até social.

Entre os mais de 670 sancionados desde a criação da norma, em 2012, estão oligarcas russos, militares birmaneses, líderes autoritários e empresários ligados ao tráfico humano e à repressão política.

A sanção já levou magnatas próximos a Vladimir Putin a perderem contas bancárias, cartões de crédito, perfis digitais, contratos com plataformas de tecnologia e até acesso a serviços de streaming.

A aplicação da lei a Moraes, formalizada em 30 de julho de 2025, coloca o Brasil no mesmo patamar de países como China, Síria, Irã, Venezuela, Bulgária e Camboja, nações com histórico de repressão. Não há, até agora, nenhuma outra autoridade brasileira ou empresa nacional listada na Magnitsky.

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Ainda que Moraes não possua ativos declarados nos Estados Unidos, os efeitos indiretos da sanção podem ser significativos. Pela estrutura da lei, empresas americanas estão proibidas de manter relações com os sancionados, sob pena de multas bilionárias.

Como consequência, bancos no Brasil, por usarem sistemas financeiros baseados em dólar e operarem com instituições americanas, podem encerrar contas vinculadas a Moraes. A lógica se aplica também a bandeiras de cartão de crédito (como Visa e Mastercard), aplicativos, plataformas de streaming e operadoras de celulares. Até mesmo o uso de iPhones pode ser restringido, caso o iCloud e a App Store neguem acesso.

Experiência de outros sancionados reforça o alerta

Após o início da guerra na Ucrânia, oligarcas russos começaram a receber notificações de encerramento de contas em bancos europeus, asiáticos e do Oriente Médio. Em poucos meses, muitos já não conseguiam usar cartões de crédito ou manter contratos com empresas internacionais.

Casos semelhantes ocorreram com generais de Mianmar envolvidos em massacres da minoria rohingya e com o líder checheno Ramzan Kadyrov, aliado de Putin, acusado de tortura e desaparecimentos forçados. Até clubes esportivos e academias ligadas a ele foram alvos de sanções.

A lei também tem alcance na América Latina. Na Guatemala, dois ex-parlamentares foram punidos por tentar interferir na nomeação de juízes. Já na África, empresários ligados a contrabando de ouro foram atingidos em parceria com o Reino Unido, com congelamento de ativos em múltiplos países. A China lidera o número de designações, com foco em violações contra uigures na região de Xinjiang.

O caso de Moraes é o primeiro a testar os efeitos da Lei Magnitsky em uma democracia ocidental consolidada. Nos bastidores, bancos brasileiros avaliam se manterão ou não o vínculo com o ministro, diante da possível exposição a sanções secundárias.

Como ministros do STF recebem salário por bancos públicos com operação internacional, há preocupação sobre continuidade dos serviços. Técnicos cogitaram migrar as contas para cooperativas de crédito, mas a proposta foi rejeitada.

Para além dos efeitos financeiros, a inclusão de Moraes escancara o uso político da legislação. A pressão pela sanção foi articulada por aliados de Jair Bolsonaro nos Estados Unidos, especialmente seu filho Eduardo Bolsonaro, que atua para exportar o embate com o Supremo à arena internacional.

O Departamento do Tesouro americano não apresentou provas públicas contra Moraes, apenas citações genéricas à repressão de liberdades.

Histórico

Desde que se tornou lei permanente, em 2022, a Magnitsky passou a ser vista como uma arma diplomática. A norma teve origem em 2009, após a morte do advogado russo Sergei Magnitsky, que havia denunciado um esquema bilionário de fraude envolvendo autoridades de Moscou.

Detido, torturado e morto em uma cela, Magnitsky se tornou símbolo global da luta contra a impunidade estatal. Desde então, a legislação foi expandida para atingir qualquer indivíduo envolvido em abusos sistemáticos de direitos humanos ou corrupção, com sanções que incluem proibição de entrada nos EUA, bloqueio de bens e corte de relações com empresas americanas.

Impacto das sanções vai além do bloqueio de bens

Estudos recentes ajudam a entender por que a aplicação da Lei Magnitsky contra Moraes pode ter consequências duradouras, mesmo que ele não tenha contas ou imóveis nos Estados Unidos.

Em uma pesquisa empírica conduzida em 2023 pelo jurista Anton Moiseienko, em parceria com o International Lawyers Project, foram analisados os efeitos reais da sanção sobre 20 indivíduos designados sob a Magnitsky Global.

Moiseienko, professor e pesquisador da Australian National University, destacou ao Law Society Journal que a eficácia das sanções é frequentemente discutida em termos teóricos.

“Há uma discussão de longa data sobre se as sanções funcionam e o que significa que elas funcionem”, afirmou. “Mas o desafio é que a discussão pode se tornar muito teórica quando as pessoas começam a falar sobre o que a eficácia pode significar, quais são os objetivos das sanções e o que elas pretendem alcançar.”

O estudo buscou um caminho mais pragmático: identificar o que, de fato, muda na vida dos sancionados. O levantamento mostrou que, embora um terço dos alvos não tenha sido afetado diretamente pelo congelamento de ativos, a maioria sofreu impactos relevantes: bancos e empresas do setor privado passaram a recusar qualquer vínculo com os sancionados, mesmo em países que não são obrigados a seguir a legislação americana.

“Também há consequências menos diretas das sanções”, disse Moiseienko. “Mas ainda são consequências muito importantes. Por exemplo, bancos em países que não são obrigados a cumprir as sanções americanas continuam recusando o cliente alvo. Isso não é uma consequência direta das sanções, no sentido de que não é uma exigência deles, mas afeta significativamente a vida dos indivíduos envolvidos.”

Segundo o pesquisador, em diversos casos, a inclusão na lista Magnitsky provocou investigações criminais locais, justamente por dar visibilidade internacional a denúncias de corrupção ou abuso de direitos humanos.

A combinação de barreiras financeiras, perda de reputação e reações de empresas globais tem se mostrado mais eficaz que a mera proibição de entrada nos Estados Unidos.




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