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Economia

Milei incentiva argentinos a ‘tirar dólares debaixo do colchão’; entenda os motivos

- 03/06/2025 3 Visualizações 3 Pessoas viram 0 Comentários
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O presidente da Argentina, Javier Milei, anunciou em maio um plano ambicioso para repatriar parte dos US$ 246 bilhões em dólares não declarados que, segundo estimativas oficiais, estão fora do sistema financeiro do país. O objetivo é atrair novamente esses recursos para o circuito bancário nacional e reforçar a base de capital da economia, marcada pela escassez crônica de divisas.

A proposta permite que cidadãos utilizem até US$ 43 mil para comprar imóveis ou depositem até US$ 85 mil em prazos fixos, sem a necessidade de declarar a origem do dinheiro. “Seus dólares, sua decisão”, afirmou o porta-voz presidencial, Manuel Adorni.

O plano é uma tentativa de reverter décadas de desconfiança no sistema financeiro argentino, que levou milhões de cidadãos a dolarizar suas economias e guardá-las fora do circuito formal — seja em casa, em cofres bancários ou no exterior.

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De colapso em colapso: como a desconfiança se consolidou

A história da economia argentina é marcada por traumas financeiros profundos. Um dos marcos foi o “Rodrigazo”, em 1975, quando o então ministro Celestino Rodrigo desvalorizou o peso em mais de 100%, corroendo o valor das poupanças da noite para o dia.

Décadas depois, em 2001, o “Corralito”, imposto por Domingo Cavallo, congelou contas bancárias em dólares e forçou sua conversão em pesos desvalorizados.

Esses episódios consolidaram o hábito argentino de guardar dólares fora dos bancos, prática que ficou conhecida como “guardar debaixo do colchão”. Para muitos, trata-se menos de uma evasão e mais de uma estratégia de sobrevivência frente à instabilidade econômica e ao temor de confisco.

A escassez de dólares paralisa a economia

O impacto dessa dolarização informal é profundo. Com menos dólares circulando no sistema bancário, faltam reservas internacionais para sustentar a taxa de câmbio e financiar importações. O resultado é uma economia paralisada, incapaz de crescer de forma sustentada.

Segundo o Instituto Nacional de Estatística e Censos da Argentina (Indec), o valor total estimado em dólares fora do sistema equivale a 45% do PIB argentino e supera em mais de seis vezes as reservas internacionais do Banco Central, que somam US$ 38,3 bilhões.

“Se esse dinheiro for investido na Argentina, imagina como seria o país”, disse a diretora-geral do FMI, Kristalina Georgieva, durante evento com parlamentares em Washington.

Milei busca confiança e tenta blindar plano de críticas

Para tentar conquistar adesão, o governo aposta em uma abordagem liberal e sem punições. “Você não guardou dólares debaixo do colchão porque odeia o país. Você fez isso porque, do outro lado, havia um grupo de criminosos que te roubou com o imposto inflacionário”, declarou Milei durante o Congresso Econômico Argentino.

A medida chega na esteira de uma anistia fiscal bem-sucedida em 2024, que regularizou US$ 22,5 bilhões, e também do novo empréstimo de US$ 20 bilhões do FMI.

Mas a proposta não passou despercebida por organismos internacionais. A secretária de comunicação do FMI, Julia Kozack, alertou que o plano precisa estar alinhado aos compromissos assumidos pela Argentina no combate à lavagem de dinheiro. “Estamos observando com bastante atenção”, disse.

Uma ambição histórica — e um teste de confiança

Desde os anos 1980, sucessivos governos tentaram, sem sucesso, atrair os dólares escondidos da população. A proposta de Milei é mais uma tentativa de reconquistar a confiança dos argentinos nas instituições — e, sobretudo, na própria moeda nacional, que há décadas se desvaloriza de forma persistente.

A grande questão, segundo analistas, é se o atual governo terá capacidade institucional e estabilidade política para manter as novas regras no longo prazo. Porque, como ensina a história econômica argentina, não basta propor: é preciso garantir que desta vez o colchão não seja mais seguro que o banco.

Para Sol Azcune, analista política da XP, a mudança introduzida por Milei na política econômica é “histórica”, e agora o mercado estará observado de perto as eleições parlamentares marcadas para outubro: “O cenário é relativamente otimista para o governo Milei na composição no Congresso”, afirmou.

“O mercado vai ter (com a eleição) uma melhor leitura de quanto a população está acompanhando esse novo governo e seu programa econômico. Mas isso também deve determinar qual o espaço do governo Milei terá para avançar sua agenda nos próximos dois anos”, completou.




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