A casa própria é um sonho compartilhado entre a maioria dos brasileiros. Um estudo da Brain Inteligência mostra que, no terceiro trimestre de 2024, 46% dos entrevistados tinham a intenção de comprar um imóvel nos próximos 24 meses. Comparado a um ano antes, houve um crescimento de 15%, mas, daqui para frente, as condições de financiamento e do crédito imobiliário serão mais desafiadoras para os compradores. Desde 1º novembro, a Caixa Econômica Federal passou a adotar novas regras de financiamento do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). A mudança ocorreu refletindo tanto a alta demanda por crédito e a queda nos depósitos na caderneta quanto a redução de prazos para investimento em Letra de Crédito Imobiliário (LCI). Agora, o banco passa a financiar somente 70% do valor do imóvel, e não mais 80% como antes, pelo Sistema de Amortização Constante (SAC). Já pela Tabela Price, o financiamento máximo será de 50% do valor, contra os 70% anteriores. E mais: o limite para o valor do imóvel passa a ser de até R$ 1,5 milhão e o comprador não pode ter financiamento ativo na instituição. Sandro Gamba, presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), destaca que a Caixa, que responde por 70% dos financiamentos no país, ajustou sua política a fim de garantir a sustentabilidade do seu crédito a médio e longo prazos. Os bancos privados, por sua vez, passaram a elevar suas taxas de juros.
Juros mais altos e o custo do créditoMas, apesar das dificuldades, o ano de 2024 foi um dos melhores para o setor, sobretudo em relação às contratações de crédito imobiliário com recursos da poupança e do FGTS. A previsão da Abecip é de que o total chegue a R$ 300 bilhões, crescimento de 20% frente aos R$ 250 bilhões contabilizados no ano passado. Ainda assim, o segmento de financiamento habitacional está apreensivo com o que está por vir em 2025. Não é de hoje que a poupança tem perdido a atratividade para os brasileiros. Desde 2020, quando atingiu o saldo recorde de R$ 1,03 trilhão, com uma captação anual de R$ 166,3 bilhões, a caderneta tem observado uma fuga de investidores. Até o último mês de novembro, a captação em 2024 está negativa (com mais retiradas do que entradas) em R$ 20,4 bilhões, com saldo de R$ 1,02 trilhão. Luiz França, presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), destaca que o setor projeta um cenário de estabilidade em relação aos recursos da poupança. Ainda assim, fundings alternativos, caso das LCIs, principalmente, e Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), Letras Imobiliária Garantida (LIG) e Fundos de Investimentos Imobiliários (FII), cada vez mais, ganham relevância na composição do crédito.
Apesar de pontuar que as empresas mostram saúde financeira e capacidade de atravessar esse período, França critica as mudanças recentes dos prazos de resgate nas LCIs. Desde o início deste ano, o Conselho Monetário Nacional (CMN) mudou o prazo de liquidez (tempo em que o dinheiro fica “retido” no investimento) duas vezes: inicialmente eram 3 meses, subiu em fevereiro para 12 meses, e depois, em agosto, reduziu para 9 meses. “Antes da mudança, o volume de distribuição mensal era de cerca de R$ 30 bilhões. Hoje, esse número caiu para R$ 10 bilhões”, alerta Sandro Gamba. Segundo o presidente da Abecip, o prazo maior atende apenas investidores qualificados, que exigem uma taxa mais alta. “Isso encarece o custo de funding para os bancos e, consequentemente, o crédito imobiliário.” Não bastasse a queda na emissão das LCIs, Gamba ainda aponta que, com a menor participação da poupança, cresce a correlação entre o crédito imobiliário e as taxas de mercado. Junto ao fato de a Selic ter voltado a subir para 12,25% ao ano — com o Comitê de Política Monetária (Copom) projetando mais duas elevações nas próximas reuniões —, a atenção maior deve se dar na curva longa de juros. “A estrutura de funding vem se ajustando, com a poupança representando apenas 34% do total, e o FGTS, 26%. Agora, 40% do crédito vem do mercado de capitais. Qualquer movimentação da taxa de dez anos pode contribuir para a precificação do crédito imobiliário”, diz. Atualmente, o contrato futuro dos Depósitos Interfinanceiros (DI) para 2034 está na casa dos 13,6%. Entrada maior no financiamento e o impacto para a classe médiaAinda que desafiador, o sonho da casa própria, hoje, tem um peso significativo na vida dos brasileiros. Dados preliminares do Censo Demográfico 2022: Características dos domicílios, divulgados na última quinta-feira (12) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que 1 a cada 5 pessoas (20,9%) vive de aluguel. Em 2000, essa parcela era de 12,3% e, em 2010, de 16,4%. “Essa situação reflete as dificuldades de acesso ao crédito imobiliário, afetando principalmente a classe média”, aponta Jefferson Mariano, analista socioeconômico do IBGE e professor na Faculdade Cásper Líbero. Ele lembra que a população de baixa renda é atendida pelo Programa Minha Casa, Minha Vida, por meio de recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que permite o financiamento de imóveis de até R$ 350 mil para famílias com renda total de até R$ 8 mil por mês. Mas com a necessidade de um maior valor de entrada, a moradia vai ficar mais pesada no bolso da classe média. “São pessoas com renda individual média entre R$ 5 mil e R$ 7 mil, que geralmente já têm gastos mensais com o aluguel”, diz Mariano. Na cesta do IPCA, a habitação é o terceiro item com maior peso no orçamento familiar, atrás apenas da alimentação e do transporte.
Pensando em uma família com renda mensal pouco acima dos R$ 8 mil, impossibilitando a adesão ao Minha Casa, Minha Vida, o ideal é que o valor máximo pago em aluguel seja de R$ 2,4 mil. É o que calcula Jeff Patzlaff, planejador financeiro CFP® ️e especialista em finanças comportamentais. “Após descontar o aluguel, é ideal destinar entre 20% e 30% da renda líquida para a entrada do imóvel, algo entre R$ 1,6 mil e R$ 2,4 mil por mês”, frisa. A pedido do InfoMoney, o especialista fez algumas simulações considerando o cenário de quem busca financiar um imóvel de R$ 500 mil com as novas regras, com entradas tanto pelo SAC quanto pela Tabela Price. O cálculo ainda considerou duas situações distintas: quem deseja juntar dinheiro em 5 anos, independentemente do valor, e quem só pode reservar R$ 1 mil por mês, pelo tempo que for necessário. Confira abaixo: Para acelerar o ganho do valor reservado, Patzlaff não recomenda a aplicação na poupança, mas em ativos de renda fixa com rentabilidade anual que passem de 12%. “Aqueles com juros pós-fixados são uma ótima opção, já que estamos com, e devemos ter por um bom tempo, uma taxa Selic alta. Outra sugestão são investimentos atrelados ao IPCA, pois oferecem proteção contra a inflação.” Entre os ativos recomendados pelo planejador estão os Certificado de Depósito Bancário (CDBs), títulos públicos do Tesouro e mesmo as LCIs — que, como dito anteriormente, captam recursos para bancos financiarem o setor imobiliário e formar fundos para empréstimos habitacionais. |
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