![]() O futebol brasileiro pode estar prestes a perder uma oportunidade de colocar a casa em ordem. Receitas de R$ 10,2 bilhões entre os clubes da Série A do Campeonato Brasileiro de 2024 turbinaram investimentos, gastos e dívidas na hora em que a bola poderia ser colocada no chão. O crescimento da receita foi de 10% em comparação com 2023, puxada por negociações de atletas e a consolidação das casas de apostas como principais patrocinadoras dos clubes de futebol. Dívidas, no entanto, somaram R$ 14,6 bilhões no último ano.
Os dados são do relatório Convocados 2025, elaborado pela Convocados Gestora de Ativos de Futebol em parceria com a OutField e patrocínio da Galapagos Capital. Embora as receitas recorrentes tenham batido o seu maior valor histórico na Série A, R$ 7,88 bilhões, o crescimento em 2024 foi de apenas 4%. Para se ter ideia, o crescimento anual foi de 16,4% em 2023. Receitas recorrentes nada mais são que valores previsíveis e consistentes, como contratos publicitários, planos de sócio-torcedor, direitos de transmissão e partidas. Ganhos de receita de qualquer natureza, no entanto, não têm sido capazes de acompanhar os gastos médios da Série A do Brasileirão. O resultado financeiro acumulado em 2024 foi déficit de R$ 283 milhões no ano. “O futebol brasileiro vive uma contradição. Crescemos em faturamento, vemos um mercado mais profissional e com mais investidores olhando para o setor, mas seguimos operando com risco elevado”, diz o economista responsável pelo estudo, Cesar Grafietti. “A dependência da venda de atletas para fechar as contas é um sinal claro de que a operação recorrente dos clubes não se sustenta, é um modelo que cresce, mas cresce no limite.” Grafietti compara os resultados de 2024 com os mesmos recolhidos pelo estudo em 2014, quando a renegociação de direitos de transmissão aumentou a arrecadação dos clubes: “Ao analisar os números de 2024 fico com a mesma sensação de 2014: o dinheiro aumentou e, ao invés de servir para equacionar problemas, foi um indutor deles: mais investimentos, mais gastos, mais dívidas, num país cuja taxa de juros básica é estruturalmente alta. Regredimos 11 anos”. Os resultados operacionais demonstram esse cenário. O Ebitda (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização, na sigla em inglês) total dos clubes da Série A foi de R$ 2,06 bilhões em 2024, mas foi negativo em R$ 261 milhões no mesmo período quando considerados apenas as receitas recorrentes. Ebitda é um indicador de geração de caixa: quanto valor uma empresa gerou apenas com sua operação, subtraindo despesas de receitas, para pagar dívidas e fazer novos investimentos. Nos patamares atuais, se não houvesse venda de jogadores, o Ebitda do futebol seria negativo. Essa é uma média e a realidade de clubes pode ser muito diferente. O Palmeiras, por exemplo, tem um Ebitda total positivo de R$ 475 milhões, enquanto o Ebitda recorrente é negativo em R$ 29 milhões. O Flamengo, por outro lado, apresentou um total de R$ 308 milhões e recorrente de R$ 232 milhões, valor bem mais equilibrado. E se as vendas de atletas têm sustentado o faturamento das contas pelos clubes da elite nacional, os gastos com contratações seguem uma trajetória similar: em 2024, elas somaram R$ 3,4 bilhões, o dobro do ano anterior. “Estamos vivendo um processo de transformação radical no futebol brasileiro, tendo um mercado que vem olhando mais para produto e consequentemente faturando mais. No entanto, alguns clubes também vêm cometendo deslizes e trocando o futuro pelo presente, gastando excessivamente para ganhar hoje”, diz o cofundador da OutField, Pedro Oliveira. Efeito das casas de apostas nas receitas da Série AA elevação nas receitas do futebol brasileiro tem efeito significativo do caminhão de dinheiro despejado pelas casas de apostas em patrocínios de clubes. O relatório Convocados estima R$ 579 milhões em patrocínios master associados às bets no Brasil em 2024, equivalente a 28% das receitas comerciais somadas. A estimativa é que os contratos publicitários alcancem o valor de R$ 988 milhões em 2025. Esses números ajudaram a impulsionar a participação dos times de futebol para 2,3% de todo o investimento publicitário no ano. “No atual momento o risco é de dependência de uma indústria nova no país, em regulamentação e alvo de questionamentos que podem impactar investimentos futuros, e consequentemente menos receitas nos clubes de futebol”, destaca o relatório. A relação com as casas de apostas influenciou o crescimento de 11% das receitas comerciais da Série A em 2024. Em 2023, o aumento anual já havia atingido 29%, também sob influência dos contratos com as bets. |
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