![]() O Senado aprovou nesta quarta-feira (16), em primeiro turno, a proposta de emenda à Constituição (PEC 66/2023) que altera regras sobre o pagamento de precatórios. O texto tira os precatórios do limite de despesas primárias da União a partir de 2026; limita o pagamento dessas dívidas por parte de estados e municípios; e refinancia dívidas previdenciárias desses entes com a União. Na prática, a medida alivia estados e municípios, ao permitir que paguem dívidas judiciais em parcelas menores e com mais prazo. Também ajuda o governo federal a cumprir a meta fiscal ao retirar parte desses gastos do teto de despesas. A PEC ainda precisa de nova votação no Senado para passar a valer. A proposta é originária do Senado e foi aprovada pela Câmara dos Deputados na terça-feira (15), com mudanças, e voltou para análise final dos senadores. O texto ainda precisa ser aprovado em segundo turno para ser promulgado e substituir o texto atual da Constituição. A votação não estava prevista na pauta da sessão, mas o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, pautou a votação da PEC como item extrapauta, atendendo a um requerimento de líderes partidários para a aplicação de um calendário especial, com urgência na votação da matéria. Em resposta ao senador Eduardo Girão (Novo-CE), que questionou o tempo curto para analisar o texto, Davi disse que não pautou a PEC por decisão unilateral, mas amparado por requerimento assinado por 71 senadores. — Esta Presidência não vai incluir uma matéria tão importante sem seguir o Regimento. Reconheço que a ponderação de Vossa Excelência é pertinente, porque coloca à luz um assunto muito importante, relacionado à condição dos municípios brasileiros de quitar suas dívidas com precatórios, e os estados, da mesma maneira, e à inclusão de questões previdenciárias, que foram um avanço gigantesco proposto pela Câmara dos Deputados. E eu reconheço que é o que está asfixiando a condição dos municípios e dos estados brasileiros de cumprirem com as suas obrigações — afirmou o presidente. O requerimento de calendário especial para a PEC 66/2023 foi aprovado pelo Plenário, com os votos contrários dos senadores Hamilton Mourão (Republicanos-RS), Damares Alves (Republicanos-DF), Esperidião Amin (PP-SC) e Eduardo Girão. Alívio de contasA PEC 66/2023 foi apresentada inicialmente pelo senador Jader Barbalho (MDB-PA) para aliviar as contas dos municípios com o pagamento de precatórios — ordens de pagamento emitidas pela Justiça contra os governos federal, estaduais e municipais em razão de processos judiciais. Elas são provenientes de diversas causas, como indenizações por desapropriações, salários atrasados e pensões. O relator, senador Jaques Wagner (PT-BA), acatou as mudanças feitas pelo relator, deputado Baleia Rossi (MDB-SP), que apresentou um substitutivo, emenda que substitui o projeto original. Essa foi a versão aprovada na comissão especial da Câmara que analisou o tema. Para Wagner, a proposta é um instrumento de pacificação na relação federativa do país, “resolvendo o problema dos prazos e a situação dos débitos dos municípios junto à União”. Para ser aprovada, uma proposta de emenda à Constituição precisa obter, em cada turno, o voto favorável de 49 senadores, o que representa 3/5 da composição da Casa. A PEC 66/2023 recebeu 62 votos favoráveis e quatro contrários e passará agora por um segundo turno de votação, que deve ocorrer em agosto. Se aprovada em definitivo, a proposta será promulgada em sessão do Congresso Nacional, na forma de uma alteração na Constituição. DebateOs senadores Esperidião Amin (PP-SC), Carlos Viana (Podemos-MG), Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Eduardo Girão se posicionaram contrariamente à votação da PEC pelo Plenário. Para eles, o texto que retornou da Câmara dos Deputados deveria ser analisado primeiramente pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), responsável pelo início da tramitação de uma PEC. O senador Izalci Lucas (PL-DF) reconheceu as dificuldades dos prefeitos, mas também criticou a falta de tempo para os senadores analisarem o assunto. Segundo Izalci, que é formado em contabilidade, o teor da proposta foi alterado pelos deputados, sem clareza quanto ao impacto orçamentário da medida para a União, por exemplo. — Isso viola a constitucionalidade dessa PEC. O texto que saiu do Senado não tem nada a ver com o que está sendo votado hoje. Óbvio que os prefeitos não têm dinheiro para pagar precatórios, mas os servidores não os receberão mais daqui a alguns anos, devido à correção. Relator da PEC original aprovada anteriormente pelo Senado, o senador Carlos Portinho (PL-RJ) votou favoravelmente à nova versão, mas observou que o texto foi “muito modificado” na Câmara e vai exigir “muita responsabilidade dos prefeitos”. Já os senadores Weverton (PDT-MA), Teresa Leitão (PT-PE), Jayme Campos (União-MT) e Renan Calheiros (MDB-AL) defenderam a celeridade da votação da proposta, considerando a medida um alívio e satisfação para os prefeitos, além de “um fôlego para as administrações municipais”. — O Senado Federal, que representa a federação e os estados e municípios brasileiros, aprovou, por unanimidade, em agosto de 2024, a referida PEC 66, dando um importante passo político na renegociação dessas dívidas. No caso de Alagoas, o alívio financeiro será da ordem de R$ 8 milhões anuais. São recursos que ficarão mais livres para investimento em políticas sociais de interesse da população. […] Trata-se de claro mecanismo de transição em benefício da sustentabilidade fiscal dos municípios — declarou Renan Calheiros. O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta, participou da sessão no Plenário. Meta fiscalEmbora retire os precatórios das despesas primárias em 2026, a PEC 66/2023 acrescenta, a cada ano, a partir de 2027, 10% do estoque de precatórios dentro das metas fiscais previstas pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) em razão do arcabouço fiscal (Lei Complementar 200, de 2023). Na prática, a retirada dos precatórios e das requisições de pequeno valor (RPV) do limite ajuda o governo a cumprir a meta fiscal do próximo ano (R$ 34 bilhões ou 0,25% do PIB projetado de 2026). O total de precatórios inscritos para 2026 é de cerca de R$ 70 bilhões. Outro trecho se alinha a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), de 2023, e especifica que ficam de fora do limite de despesas de 2026 os precatórios em valor equivalente ao projetado no Orçamento de 2025 corrigido pelo IPCA. Em relação à meta de resultado primário de 2026, não entra na meta somente o valor que passar desse cálculo (o orçado em 2025 mais IPCA). A decisão do STF permitiu inclusive o uso de créditos extraordinários até 2026, que sempre ficam de fora da meta fiscal, para quitar o excedente de precatórios decorrente de cálculos considerados inconstitucionais introduzidos pela chamada PEC Emergencial (Emenda Constitucional 114, de 2021). Ainda que permita a exclusão desses pagamentos do limite do Executivo para despesas primárias, a PEC não muda a base de cálculo desse limite. Linha de créditoOutra mudança aprovada na PEC muda a data limite de apresentação dos precatórios transitados em julgado para que eles sejam incluídos no Orçamento a fim de serem pagos até o término do ano seguinte. Atualmente, essa data é 2 de abril; o texto antecipa para 1º de fevereiro, reduzindo em dois meses o prazo. Os precatórios e RPVs apresentados depois dessa data devem ser incluídos para pagamento somente para o segundo exercício seguinte. Desde 1º de fevereiro até 31 de dezembro do ano seguinte, não haverá juros de mora sobre os precatórios. Se for aprovada em segundo turno e promulgada, a PEC autoriza a União a criar linha de crédito especial em seus bancos federais para a quitação do conjunto de precatórios cujo valor passar da média de comprometimento da receita corrente líquida (RCL) dos últimos cinco anos. CorreçãoPara incorporar à Constituição a decisão do Supremo Tribunal Federal já válida desde 2015, o texto aprovado pela Câmara determina que, a partir de 1º de agosto de 2025, a atualização monetária dos precatórios será pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A compensação de mora, desde a expedição do precatório ou RPV, será de juros simples de 2% ao ano, sem juros compensatórios. Em decisão de 2015, o Supremo considerou inconstitucional a correção pela taxa referencial (TR) da poupança, que historicamente tem valores irrisórios desde o Plano Real, determinando a correção pelo IPCA. No entanto, o texto de Baleia Rossi cria nova regra: se o IPCA mais os juros de 2% ao ano forem maiores que a Selic no mesmo período, esta deverá ser aplicada em substituição. A regra vale para todos os precatórios e RPVs federais, estaduais e municipais. No caso federal, se envolver processos de natureza tributária, continuam a valer os mesmos critérios de atualização e remuneração de mora aplicados pela Fazenda para seus créditos tributários contra os contribuintes. Estados e municípiosPara precatórios devidos por estados, Distrito Federal e municípios, o texto aprovado limita o pagamento de acordo com o estoque de precatórios em atraso. Assim, em 1º de janeiro de cada ano, se os valores totais em atraso forem de até 15% da receita corrente líquida do ano anterior, o município ou estado poderá pagar os títulos cuja soma seja equivalente a 1% dessa receita. Esses índices valerão inclusive para entes federativos que não possuam estoque. Os percentuais crescem gradativamente até atingirem o pagamento equivalente a 5% da RCL se o estoque for maior que 85% da receita. O texto original previa os benefícios apenas até os estoques cuja soma chegasse a 30% da receita corrente líquida. Em todas as situações, o cálculo para encontrar o valor do estoque de precatórios será com atualização monetária e juros moratórios. AdicionalA partir de 1º de janeiro de 2036 e a cada período subsequente de dez anos, se ainda houver precatórios em atraso, os percentuais subirão para os dez anos seguintes, diz o texto. Assim, se for verificado, em 1º de janeiro de 2036, que ainda há estoques a liquidar de precatórios em atraso, para o período dessa data até 1º de janeiro de 2046 os limites percentuais serão aumentados em 0,5 ponto percentual. Na primeira faixa, o limite da RCL de 1% passaria para 1,5%, por exemplo. Estoque atualizadoToda medida efetiva de redução do estoque de precatórios tomada por estados e municípios deverá ser contabilizada para fins de cumprimento do respectivo plano anual de pagamento. A negociação de redução do valor para o credor receber antes do prazo é um exemplo. O texto deixa de fora dos limites de pagamento aqueles precatórios utilizados em um encontro de contas entre o município ou estado e outros entes federativos (União, por exemplo) ou entre eles e credores privados que queiram pagar débitos com esse título. Pagamento em atrasoSe o estado ou município atrasar o pagamento do precatório após a aplicação dos limites, a nova regra prevista na PEC será suspensa; e o tribunal de Justiça local determinará o sequestro, até o limite do valor devido, das contas do município ou do estado inadimplente para fazer o pagamento. Além disso, o ente será impedido de receber transferências voluntárias enquanto durar a falta de pagamento; e o prefeito ou governador responderá por improbidade fiscal e administrativa. Continuará permitido o pagamento de precatórios em montante superior aos limites estipulados. NegociaçãoBaleia Rossi incluiu no texto da PEC dispositivo específico para permitir ao credor que não receber o seu precatório em razão das limitações de pagamento optar pelo recebimento por meio de acordos diretos em juízos de conciliação. O acordo feito com estados ou municípios implicará pagamento em parcela única até o fim do ano seguinte ao da assinatura, com renúncia do ágio acertado. O texto proíbe a incidência de juros, correção monetária ou qualquer acréscimo legal dos valores repassados pelos entes federativos às contas especiais do Judiciário destinadas ao pagamento de precatórios. Esses valores deverão ser excluídos imediatamente do estoque da dívida para fins de apuração do saldo devedor. Regra atualA partir da eventual promulgação da emenda constitucional, a regra atual de limitação de pagamentos de precatórios para estados e municípios não será mais aplicada. Essa norma atual, com vigência até dezembro de 2029, prevê o depósito em conta especial do Tribunal de Justiça de 1/12 das receitas correntes líquidas desses entes federativos para o pagamento de precatórios. Permite também o uso de parte dos depósitos judiciais feitos para apresentação de ações judiciais contestando processos tributários, por exemplo. As novas regras da PEC se aplicam aos precatórios inscritos até a mesma data de promulgação. DesvinculaçãoA PEC 66/2023 aumenta, até 31 de dezembro de 2026, a desvinculação de receitas permitida pela Constituição aos municípios. O percentual de desvinculação de 30% passa para 50% até essa data. Com a desvinculação, a receita de impostos, contribuições, taxas e multas existentes ou que vierem a ser criados não precisarão ser direcionados às finalidades para as quais a lei prevê um uso. O patamar atual de 30% dessas receitas retorna a partir de 1º de janeiro de 2027 e vai até 31 de dezembro de 2032, data final já vigente para o mecanismo. No entanto, o texto determina que, até 2032, os superávits financeiros ao fim de cada ano dos fundos públicos instituídos pelo Poder Executivo municipal somente poderão ser utilizados para políticas públicas locais de saúde, educação e adaptação às mudanças climáticas. O relator retirou da PEC a desvinculação de receitas da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), uma espécie de royalty por essa extração mineral. Crise climáticaPara os exercícios de 2025 a 2030, a proposta permite à União usar até 25% do superávit financeiro de fundos públicos para projetos de enfrentamento, mitigação e adaptação à mudança do clima e aos seus efeitos e para projetos de transformação ecológica, além de projetos estratégicos relacionados à finalidade do respectivo fundo. O dinheiro deverá vir de fontes de recursos vinculadas a fundos públicos do Poder Executivo da União, como o Fundo Social do pré-sal ou o Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações). Atualmente, outros 30% já são desvinculados de todos os fundos a título de Desvinculação de Receitas da União (DRU) para serem gastos em despesas correntes federais de qualquer área. A partir de 2031, os recursos desvinculados pela PEC dessa forma e não utilizados serão devolvidos gradativamente aos respectivos fundos, assim como o retorno dos financiamentos vigentes, seguindo-se cronograma de encerramento desses financiamentos concedidos. |
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