O encontro entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, nesta quarta-feira (21), na Casa Branca, teve momentos de tensão após o americano exibir vídeos e reportagens para sustentar alegações infundadas de “genocídio” contra fazendeiros brancos no país africano.
Durante a reunião no Salão Oval, Trump mandou apagar as luzes e exibiu um vídeo com imagens de protestos e slogans ligados a Julius Malema, político de oposição sul-africano conhecido por defender a expropriação de terras. Ramaphosa permaneceu em silêncio enquanto o vídeo era exibido, mas depois afirmou não reconhecer o local mostrado nas imagens e pediu mais informações.
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Trump ainda apresentou recortes de jornais com supostos casos de assassinatos de brancos, repetindo a palavra “morte” enquanto virava as páginas. Ramaphosa reagiu dizendo que a África do Sul enfrenta altos índices de criminalidade em geral e que a maioria das vítimas é negra. Ao tentar explicar a realidade do país, foi interrompido por Trump, que afirmou: “Os fazendeiros não são negros”.
O presidente dos EUA, Donald Trump, mostra supostas reportagens durante seu encontro com o presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, no Salão Oval da Casa Branca, em Washington, D.C., EUA, em 21 de maio de 2025. REUTERS/Kevin Lamarque
Dados da polícia sul-africana mostram que, entre abril de 2020 e março de 2024, 225 pessoas foram assassinadas em áreas rurais do país. Destas, 53 eram agricultores — geralmente brancos — e 101 eram trabalhadores rurais, em sua maioria negros. Não há evidências de que brancos sejam mortos em proporção maior que outros grupos.
Trump reiterou críticas à política de reforma agrária da África do Sul, que permite a expropriação de terras sem compensação, mas prevê revisão judicial. O governo norte-americano cortou ajuda ao país, expulsou o embaixador sul-africano e ofereceu refúgio a membros da minoria branca alegando perseguição.
Ramaphosa, por sua vez, buscou redirecionar o foco da reunião para temas econômicos, como comércio e minerais críticos. A África do Sul preside o G20 até novembro e tem os EUA como segundo maior parceiro comercial, atrás apenas da China. A suspensão da ajuda norte-americana já impacta áreas como o combate ao HIV no país africano.
Apesar do tom tenso, Ramaphosa afirmou estar disposto a dialogar. “Estas são preocupações que estamos dispostos a discutir com vocês”, disse ao final da reunião.
Alegações falsas não são novas
As alegações de Trump sobre um suposto genocídio contra fazendeiros brancos na África do Sul não são novas e já foram amplamente refutadas. Em 2018, durante seu primeiro mandato, ele já havia feito postagens semelhantes nas redes sociais, baseando-se em reportagens da Fox News. À época, o governo sul-africano classificou as declarações como “informações falsas” e uma tentativa de “dividir a nação”.
Em fevereiro de 2025, um tribunal da África do Sul considerou que as alegações de genocídio branco eram “claramente imaginadas”, ao barrar uma doação de um benfeitor ao grupo supremacista Boerelegioen. Também em 2025, o presidente Ramaphosa reforçou, em vídeo publicado nas redes sociais, que “todos nós sabemos como sul-africanos, negros e brancos, que não há genocídio aqui”.
A Southern African Agri Initiative, associação que representa produtores rurais no país, também rechaçou a narrativa. Segundo declarou o diretor da entidade, Dr. De Jager, à DW, os ataques a propriedades agrícolas não configuram genocídio e não justificam a fuga do país.
Ainda assim, Trump suspendeu toda ajuda à África do Sul com base em sua interpretação da Lei de Expropriação de 2024, aprovada pelo parlamento sul-africano em janeiro deste ano. O governo dos EUA alegou que a legislação permite a expropriação de terras de fazendeiros brancos sem compensação — o que, segundo Pretória, ignora o contexto histórico do apartheid e não corresponde à realidade jurídica, pois as medidas estão sujeitas a revisão judicial.